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Cícero Lucas: do Aglomerado para Marte Um

Em 2022, um filme chamou atenção do Brasil e chegou a concorrer para figurar como indicação de produção estrangeira no Oscar: Marte Um, eleito o melhor longa brasileiro do ano passado pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) agora em fevereiro. Nós, serráqueos, podemos ficar orgulhosos, pois o personagem principal, Deivinho, é interpretado por Cícero Lucas, vindo do Aglomerado da Serra.

Na época das gravações, no fim de 2018, Cícero tinha 13 anos, mas tudo começou algum tempo antes. “Eu sou músico, assim como meu pai, e tocávamos em rodas de samba. Numa delas, o cineasta Gabriel Martins estava no público”. Quase terminando de escrever o roteiro do filme, ele e a esposa perceberam as semelhanças entre Cícero e Deivinho, mas algo de concreto só ocorreria dois anos depois: “O Gabriel conversou com meus pais e me convidou para participar de um teste algumas semanas antes de começar a gravar. Foi tudo bem simples, recebi a notícia de que havia sido aprovado pouco depois”.

Cícero teve duas semanas e meia para estudar o roteiro. “Estava animado para participar do filme, mas ao mesmo tempo com medo, pois nunca tinha atuado. Na minha antiga escola não havia teatro”. Nesse meio-tempo, o adolescente reconheceu a semelhança com o personagem, o que facilitou sua própria atuação. “A maioria das cenas eu fiz de primeira. Sou daquele jeito, carinhoso com meus pais e irmãs. Até meus parentes ressaltaram isso quando viram o filme. Eu sou o Deivinho”. Durante o mês e meio de trabalho, Cícero não frequentou a escola. “Foi dedicação total, inclusive aos domingos. Às 6h30 entrava na van para gravar em Contagem, parava para almoçar e depois ia até às 18h. Foi bastante cansativo, mas valeu a pena”.

Atualmente com 17 anos, Cícero colhe os frutos da experiência: “Na escola me chamam até hoje de Hollywood (risos), é uma pequena fama”, brinca. Aluno do 1º ano do Ensino Médio de um colégio do bairro, o jovem participa das aulas de teatro e aproveita para evoluir: “Agora que estou aprendendo as técnicas em si, como amplitude de voz, trabalhar o corpo. Eu acabo utilizando o conhecimento adquirido no filme, o diretor Gabriel Martins me deu muitos conselhos”. Para o futuro, Cícero almeja duas possibilidades: “Sempre tive contato com a música, quero estudar na UFMG. Também pretendo ser ator, o filme despertou essa vontade. Não sei qual será minha prioridade, se for possível vou trilhar as duas carreiras”.

Enquanto não chega o momento de tomar decisões, o artista dá um recado aos jovens do Aglomerado da Serra: “Não deixe de acreditar e trabalhar por seus sonhos, estude bastante e se dedique para poder agarrar uma oportunidade quando ela aparecer. O Gabriel só me conheceu porque eu estava lá tocando, o que exige horas de ensaio, não foi sorte. Há vários talentos em diversas áreas no Aglomerado que merecem ser lapidados. Precisamos de menos discriminação e preconceito e mais projetos por parte do poder público”.

Dé Lucas, pai de Cícero e músico há mais de 30 anos, com dois discos gravados e um terceiro a ser lançado ainda no primeiro semestre deste ano, vai mais longe: “A arte ainda não é valorizada no país, mesmo fazendo parte da vida de muita gente quando se lê um livro, assiste a um filme, escuta uma música. Quando a arte aparece, é sinal de que a sociedade está caminhando para um lugar melhor. Sem arte não há sociedade concreta, ela é alimento para a saúde física, mental e espiritual”.

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