Janeiro Branco: a importância da saúde mental
Você provavelmente curtiu a queima de fogos do Réveillon com um jantar em família regado a champanhe, certo? Espera-se, porém, que sua virada de ano não tenha sido só isso: “É um erro resumir essa passagem numa expressão mercadológica tão pobre”, critica o psicólogo Leonardo Abrahão, que defende o fechamento e abertura de ciclo como um momento de autorreflexão: “Deveríamos pensar sobre os rumos que a nossa vida está tomando. Janeiro tem esse nome por causa de Janus, o Deus romano das passagens”.
A fim de incentivar as pessoas, Leonardo, que também é escritor e palestrante e reside em Uberlândia/MG, decidiu criar a campanha do Janeiro Branco, que ganhou o país e é lei em Belo Horizonte: “Precisamos criar a cultura da saúde mental, ajudando as pessoas a olhar para as questões humanas, esse é o eixo em torno do qual a vida gravita. Sem saúde mental, as pessoas levam vidas muito aquém do potencial. A cor escolhida simboliza uma folha em branco, significa retomarmos a autonomia de escrever nossa história”.
Leonardo explica que as pessoas precisam olhar para dentro de si, reconhecer suas sombras, se autodescobrir: “Encare suas fragilidades, traumas, medos, jogue luz sobre o que está escondido. Quanto mais fizermos isso, mais qualificadas serão nossas relações”. O psicólogo exemplifica que há muito casamento e namoro às cegas, em que a pessoa não conhece a si própria e ao parceiro e convive com outra na mesma situação, sob ilusões e fantasias. “Tem gente que ganha dinheiro com o que não quer trabalhar e adoece por isso, pois não se sustenta emocionalmente”.
Leonardo defende que o ser humano é capaz de se questionar e avaliar seus pensamentos, embora não seja ensinada a psicoeducação, um processo que leva as pessoas a se educarem em relação às suas condições psicológicas: “Não há psicoeducação nas escolas, empresas e igrejas, esse potencial está hibernando. O psicólogo pode ajudar a desenvolvê-lo, mas não é o único caminho”.
Um sinal de que você não se autoconhece nem consegue resolver os conflitos internos pode ser a somatização: “O corpo humano tem a capacidade de transformar em questões físicas o que se passa em nossas emoções e sentimentos. Por exemplo, é a raiva que vira gastrite, o medo que gera intestino solto”. Leonardo afirma que a meditação é um dos caminhos comprovados para o autoconhecimento, pois você se desliga do mundo externo, da correria, do piloto automático da vida. Porém, “nem todo mundo precisa meditar, há pessoas que se conectam consigo mesmas ouvindo música calma, caminhando, praticando esportes, jogando futebol etc.”, define.
O psicólogo defende que precisamos estar despertos existencialmente: “Somos animais racionais, mas não vivemos racionalmente. Quem não se autoconhece não enxerga o que quer para a própria vida e segue padrões inalcançáveis, frustrando-se”. Àqueles que tiveram um 2020 difícil, Leonardo Abrahão sugere questionar isso e perceber as oportunidades em meio às adversidades: “Não é uma visão cor de rosa da vida, todo crescimento pressupõe dores e adaptações. Não podemos apenas ficar reclamando de 2020, precisamos reconhecer que escola de vida ele foi, apesar dos legítimos sofrimentos que nos trouxe”.
A saúde mental das crianças nas férias de 2021
O ano escolar de crianças e adolescentes foi uma verdadeira bagunça, mas o psicólogo Leonardo Abrahão defende que as férias são necessárias: “Independentemente do que aconteceu, eles precisam de descanso, pois foram um dos grupos sociais que mais sentiu os efeitos da pandemia. Afinal, escola não é só educação formal mas também outras maneiras de formação do sujeito como interação, brincadeiras, recreio etc”. Com quase um ano de pandemia, o profissional sugere um equilíbrio no brincar das crianças menores: “A falta de interação com outras crianças traz efeitos colaterais como atraso na fala e no desenvolvimento cognitivo e motor. Portanto, escolha espaços bem abertos e arejados como parquinhos e deixe seu filho ou neto brincar com outras crianças, sempre com máscara e álcool em gel”.
Segundo Leonardo, atividades recreativas e artísticas contribuem para o desenvolvimento humano, mas cada um precisa fazer o que mais lhe agrada: “A criança não deve ser forçada a desenvolver aptidões, mas ter garantida a possibilidade de suas habilidades e aptidões se manifestarem. Seja com artes, música, esporte e/ou leitura. O ser humano existe para desenvolver seus potenciais, mas devem-se criar condições para tal”.
Dentro de casa, os pais devem continuar atentos: “Converse, dialogue, dê afeto, esteja presente na vida de seus filhos. Isso não significa estar ao lado deles com o celular em mãos. Os pais devem garantir o direito de a criança brincar, mas não é para deixá-la dedilhando no celular ou no tablet”, alerta. O psicólogo afirma que existem estudos contraindicando a crianças de até 3 anos o uso desses aparelhos, pois é quando o cérebro está no desenvolvimento máximo das conexões neurais: “Preencher isso com estímulos artificiais rouba tempo das interações sociais, pois a criança percebe menos gostos, sabores, texturas, estimula menos pernas e braços. Seres humanos se formam ao se relacionarem com os outros”.
Ter uma família funcional também contribui para a saúde mental dos pequenos: “Os pais precisam atender às necessidades psicológicas e físicas de todos os membros com estímulos, incentivo, proteção, presença etc. Encare e discuta dores e problemas, não os negue, pois isso prejudica a saúde mental de todos os envolvidos”.
Leonardo avisa que os pais precisam estar presentes até para ajudar quando há algum problema: “Muitos pais não investem numa relação íntima e de companheirismo com seus filhos e, quando surge um sinal de alerta, querem bancar o melhor amigo. Isso não funciona, é preciso focar no processo para colher a confiança como resultado. Confiança se constrói, não se cobra”.
O psicólogo elenca alguns sintomas de que a saúde mental da criança ou adolescente não está boa: quietude anormal; busca pelo isolamento; regressão no controle da urina e das fezes; dores injustificadas pelo corpo (somatização); vômito injustificado; resistência a ser deixada em locais onde estava adaptada; nega o que gostava de comer; vontade injustificada e persistente de voltar a dormir na cama dos pais após ter se adaptado; insônia; manifestação persistente de ansiedade em razão da possibilidade de afastamento dos pais e ansiedade injustificada na presença de alguém. Pais, fiquem atentos à qualidade de vida de seus filhos!