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Muito cuidado para não ficar superendividado

Matéria publicada na edição de Dezembro/2020

Fim de ano, Natal, confraternização. É grande a tentação de presentear familiares e amigos, mas você precisa saber se seu orçamento é suficiente. O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, sugere que o consumidor observe a regra dos terços: “1/3 dos rendimentos você utiliza para as necessidades básicas como comida, água e luz. Outro terço é para poupar a fim de usar em emergências, sendo o último terço para o pagamento de dívidas”.

O especialista alerta que hoje isso está completamente invertido, com as dívidas comprometendo 70%, 80% dos rendimentos, o que configura superendividamento. “O consumidor não consegue mais pagar o que deve e tem comprometido o mínimo de 30% necessário para sua subsistência”. Marcelo aponta que o superendividamento, ao contrário do que parece, atinge todas as classes sociais: “Conheço gente de baixa renda totalmente organizada e gente de Classe A que deve R$ 200 mil. É reflexo da falta de educação financeira, de um planejamento do orçamento familiar”.

E não é fácil estar superendividado: “Significa dizer que o indivíduo está excluído socialmente. Isso traz problemas físicos e psicológicos de toda ordem como ansiedade, irritabilidade que causa brigas em casa, separação familiar. A pessoa não consegue dormir, gasta dinheiro com remédios, corre risco de acidente de trabalho por estar desmotivado. Conheço até dois casos concretos de suicídio”, lamenta o coordenador do Procon Assembleia.

Em 2019, de cada dez pessoas que procuraram o órgão, seis queriam resolver problemas com dívidas: “Desde o ano passado percebemos um movimento inédito de pessoas querendo negociar contas de água e luz. É o endividamento entrando no terço do mínimo de sobrevivência”, explica Marcelo Barbosa. O coordenador avalia que os mutirões de renegociação de dívidas, com descontos de até 90%, estão mais frequentes: “São uma sensibilização com a situação econômica do país, em que os bancos e empresas aceitam que é melhor receber parte da dívida do que nada. A Cemig fez recentemente isso. É uma oportunidade para a pessoa repensar o que está acontecendo e não voltar a se endividar”.

Aproveitando o fim de ano, Marcelo Barbosa dá três dicas importantes quando você for comprar alguma coisa: “Pergunte-se se tem dinheiro, se precisa daquilo e se tem que ser agora ou pode esperar. Se você respondeu sim a todas elas, pode fazer o negócio. Caso contrário, não compre, pois estará se endividando. O 13º salário deve ser usado para pagar dívidas e guardar para as contas do início do ano. Se sobrar, aí sim pode comprar um presente de Natal melhor, fazer uma viagem etc. Bote no papel e lápis todos os rendimentos e gastos, inclusive a cervejinha do fim de semana. Dá certo no médio-longo prazo”, finaliza.

Os grandes riscos do empréstimo consignado

As dívidas mais comuns que se enquadram no superendividamento são as de empréstimo e cartão de crédito, com 95% das reclamações no Procon Assembleia: “Só os empréstimos, entre eles o consignado, ocuparam o terceiro lugar de reclamações em 2019”, aponta o coordenador do órgão, Marcelo Barbosa, que completa: “As pessoas usam cartão de crédito e cheque especial para complementar o salário, e a conta vem depois”.

O empréstimo consignado, que atende aposentados, pensionistas do INSS e funcionários públicos, tem vantagens em relação ao pessoal, como juros bem menores (1% a 2% ao mês contra mais de 6%), pois é descontado diretamente da folha de pagamento, com risco zero para o credor: “Deve ser utilizado para pagar dívidas com juros maiores, desde que você não comprometa mais que 30% da renda”.

Mas o coordenador alerta para algo muito comum: “Por lei, o limite do crédito consignado está em 35% dos rendimentos. Quando a pessoa atinge isso, ela faz um empréstimo pessoal no caixa eletrônico, comprometendo 80% da renda e ficando superendividada”. O que mais preocupa o coordenador do Procon Assembleia é o cartão de crédito consignado: “Não utilize o limite de 5%, pois é uma dívida interminável pela própria sistemática da operação, a pessoa acumula juros impagáveis”.

Se decidir pelo empréstimo consignado, Marcelo Barbosa dá dicas: “Não o faça por telefone, e-mail ou WhatsApp, você não sabe quem está do outro lado, se a instituição é autorizada. É muito precário, o contrato deveria ser por escrito”. O coordenador do Procon Assembleia avisa que o banco é obrigado a informar quanto o empréstimo vai custar por mês, valor e quantidade de parcelas, juros mensal e anual e qual será a dívida total ao fim da operação: “Está no Artigo 52 do Código do Consumidor. Veja seu contracheque todos os meses para verificar se o acordo está sendo cumprido”. Outra orientação é denunciar ao Branco Central e ao Procon a venda casada: “A instituição avisa que só dará o empréstimo se você fizer um seguro de vida ou título de capitalização, isso é proibido”.

O Procon oferece ajuda quando houver irregularidade no empréstimo, se ele foi feito sem autorização ou em condições diferentes da combinada: “Tente resolver com o credor, se não conseguir entre em contato com o Procon Assembleia no site www.almg.gov.br/procon. Se, antes da contratação do empréstimo, você não sabe se os juros praticados são abusivos, pode nos procurar”.

Marcelo e outros coordenadores de Procons estão numa luta inglória resumida no Projeto de Lei 3515/2015: “No Brasil não há lei que dê direito ao consumidor de renegociar suas dívidas, depende do credor. Isso ocorre em outros países”. Em resumo, a proposta é proibir o assédio ao consumidor no meio da rua e por telefone; ofertar o crédito mais claramente; o-brigar o credor a analisar as condições financeiras do consumidor antes de emprestar dinheiro para saber se ele poderá honrar a dívida, pois as instituições que oferecem consignado e empréstimo pessoal não se comunicam; além de assegurar à população o direito à educação financeira. “O PL tramita muito lentamente desde 2012, pois lida com o poder econômico e seus interesses. Estamos mexendo na dinâmica dos bancos e instituições financeiras”.

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