Os detalhes da festa do Cacarecos da Serra
O trabalho dos integrantes do Cacarecos da Serra era extenso. Gerson conta em seu livro de memórias que no início do bloco a fantasia e a bateria eram “as mais simples possíveis, pois não tínhamos a menor condição financeira para coisa melhor”. Os cacarecos vestiram chapéu de palha pintado com esmalte branco, camisa branca de manga comprida, fechando o colarinho com uma gravata borboleta preta, além de calça azul e tênis branco.
Anos mais tarde, resolveram copiar a roupa do bloco Imigrantes da Abissínia, da Floresta, com as cores invertidas: “Calça três quartos vermelha, camisa verde de mangas compridas com gola e punhos pretos, colete preto na frente e amarelo nas costas, com a inscrição Cacarecos da Serra, além de meia de futebol verde e tênis branco. Sem contar a cartola preta com o laço vermelho e o rosto pintado de preto. Ao redor da boca, metade amarelo e vermelho”, afirma Gerson em seu livro. Ronald completa: “Chamavam-nos de boi da Serra”.
Os tamborins e os surdos chegaram a ser feitos com galões de tinta a óleo e latões de óleo, tambores de 200 litros, respectivamente. Só depois os instrumentos passaram a ser confeccionados de aço.
Para financiar toda a estrutura, os integrantes pagavam mensalidade, mas também vendiam seus bens e materiais recicláveis ao ferro-velho. Gerson conta no livro que chegou a negociar sua criação de pombos com o Clube Mineiro dos Caçadores, onde hoje fica um condomínio, em frente ao Minas Tênis Clube.
Todo o trabalho era para desfilar na Av. Afonso Pena. No caminhão havia um palanque montado em degraus que desciam para as duas laterais e a traseira da carroceria, que “ficava muito alto”, conta Nelson. Ele se recorda de um episódio que quase se tornou tragédia: “Marcão Cacareco se distraiu num dos desfiles e já ia colocando as mãos nos fios de alta tensão do trólebus”, os ônibus elétricos que circulavam em Belo Horizonte naquela época. “Foi por uma fração de segundos que o pior não aconteceu”.
Primeira formação: Jones Monteiro; Darwin (Lampião); João Batista de Assis (João Perereca); Zé Wilson; os irmãos Toninho e Ubaldo Barreto (Céu Azul); Bernardo Aroeira; Pinto, Zé Maria e Reginaldo (os três eram irmãos); Olavides, os irmãos Rubinho e Luizinho; José Rômulo e Geraldo (primos de Gerson), Marcão Carareco e os irmãos Adilson e Edílson
Música oficial:
A Serra esse ano vai brilhar.
O cacareco todo vai descer.
Cacareco Cacareco vai tocar.
O samba marcha até o couro arrebentar!
Cacacacarecooo, a Serra de ti vai orgulhar!
Cacareco, o rinoceronte eleito vereador
Cacareco deu nome e foi a mascote do bloco de Carnaval da Serra, mas não era um animal qualquer. O rinoceronte fêmea ganhou fama após uma frase do então governador de São Paulo e que viria a ser presidente do país, Jânio Quadros.
Ele havia pedido o empréstimo do animal ao zoológico do Rio, pois estava para inaugurar um em São Paulo nos idos de 1958. Em seu novo lar, o rinoceronte fêmea chamava a atenção dos visitantes e era o animal mais popular. Diante disso, Jânio Quadros disse que Cacareco, com o sucesso que fazia, seria um forte candidato ao governo de São Paulo.
No ano seguinte, Cacareco realmente se tornou “candidato”, mas para a Câmara Municipal. Insatisfeita com a qualidade dos políticos, a população escolheu Cacareco como símbolo dos votos de protesto – escrevia-se o nome do candidato nas cédulas de papel -, “elegendo-o vereador” com quase 100 mil votos, mais do que o partido mais votado do pleito. Sob protesto dos paulistanos, o rinoceronte fêmea, o primeiro de sua espécie nascido no Brasil, acabou devolvido ao zoológico do Rio dias antes das eleições. Morreu em dezembro de 1962, aos oito anos. Ronald Rezende de Carvalho esclarece que o Cacarecos da Serra não teve o mesmo viés de protesto: “Só aproveitamos o nome, muito conhecido na época”.